O dia custou a chegar. A noite passada pareceu ser a mais longa do ano. Longa também foi sua insônia. Estava pensativo. Folheava revistas, disparava o controle remoto, ouvia o radinho de pilha. Tudo ao mesmo tempo, como sempre. Era um viciado em informação. Não sossegava. Queria estar sempre catando vozes, imagens e letrinhas.
Não era jornalista. Não tinha profissão definida. Quando criança pensou em ser escritor. Mas nunca conseguiu se disciplinar a ponto de escrever uma linha que fosse. Cedo, deu sinais do seu vício. Era compulsivo. Era o pai virar as costas e lá estava ele mexendo no dial em ondas médias e curtas a procura de programas de esportes e policiais. Sem contar os pastores evangélicos e seus rituais de exorcismo.
Logo que percebeu o interesse do menino pela mídia, a mãe teve uma idéia “brilhante”: levá-lo até um programa de perguntas e respostas, tipo O Céu é o Limite, para que ele respondesse sobre um determinado assunto. Naquela época, com dez anos de idade, ele não tinha a exata medida do que aqueles holofotes significavam. Era divertido ver a empolgação do apresentador do programa e ganhar os aplausos da platéia.
Não entendia o delírio que provocava a cada resposta certa a respeito de um tema que para ele era tão banal. O tema? A viagem do homem a Lua. Sabia tudo: horários, nomes dos astronautas, da aeronave... Era sucesso certo. Todos queriam assistir aquele garotinho tão esperto.
O sucesso era tanto que a produção do programa já o mantinha há cinco semanas. E a cada aparição, o pai e a mãe embolsavam Cr$ 100,00. Para o menino, o cachê vinha em forma de diversão. Ele fazia daquilo um ritual. Se preparava com antecedência, se concentrava e se não lembrasse de algum detalhe sabia exatamente em que ponto da estante estavam as informações que necessitava.
Estava entrando na sexta semana de programa e seus pais já pensavam em dar um tempo. A idéia deles era tirar proveito de seus conhecimentos em outra oportunidade. Mas com um substancial aumento no cachê, os pais mudaram de idéia e lá foi o menino para mais uma exibição.
Aquela parecia uma noite especial. As repostas “saíam” tranqüilamente. Com uma rapidez impressionante, o menino causava sensação. Mas algo estava saindo errado.
De repente, ele ficou pálido, muito pálido. Ninguém parecia perceber. A platéia aplaudia suas respostas. Seus pais também. O apresentador era todo “sorrisos”, prestes a anunciar uma nova etapa para o garoto.
Pergunta feita, expectativa pela resposta. Mas nada. O apresentador refez a pergunta e mais uma vez, nada de resposta. O menino estava cada vez mais pálido. A platéia trocou os aplausos por olhares apreensivos, enquanto os pais correram ao palco para socorrê-lo. Tarde demais. Ele caiu desmaiado. Bateu a cabeça no chão e ficou desacordado. Pai e mãe desesperados. Ele foi levado de ambulância para o hospital. Apesar dos esforços, nada. Entrou em estado de coma.
“Acordou” anos depois num dia que custou a chegar.
Gostei do conto, Alexandre. Lembrei do filme Magnólia, do garoto-gênio que urina nas calças durante o Quiz Show, e torna-se um adulto frustrado, eternamente marcado pela fama de quando era criança.
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